quinta-feira, 8 de março de 2012

There and back again

Eu inventei de fazer esse blog justo agora quando quase ninguém mais tem blog (uma pena em certos casos, porque era legal nos velhos tempos) pra colocar coisas da minha vida pseudo renovada e da faculdade e tudo mais pra que depois eu pudesse voltar e ver como as minhas impressões sobre várias coisas teriam mudado e tal. Mas isso não aconteceu porque:

- Eu tinha mais o que fazer;
- Deveria ser boring pra alguém que não fosse o eu do futuro perdesse tempo lendo;
- Só sei escrever semi-críticas à sociedade e coisas sem sentido.

Daí eu resolvi fazer isso hoje simplesmente porque eu não sei mais o que falar da sociedade nem tenho adjetivos legais pra novas metáforas nem lirismo suficiente pra escrever nada viajante no momento e tem muito tempo que eu não atualizo isso aqui, tô com medo de cancelarem a conta (pois é). 

Então, vamos lá. Quando eu cheguei nessa vida de estudante fora de casa e medicina, etc., eu achava que: ia ser tudo muito bom, meio difícil porque ia dar trabalho pra por exemplo me alimentar direito (era minha principal preocupação) e que eu ia estudar algumas coisas que eu não ia achar tão legais no começo mas que não seria o martírio que era o ensino médio, que eu ia sair pouco e que provavelmente não teria muita gente que tivesse a ver comigo pra eu fazer amizades realmente duradouras e tudo mais. 

Agora eu acho que: não é tudo muito bom, é tudo muito difícil e eu realmente ligo mais de não ver muita que eu tenho (pasmem) saudades do que ter que jantar doritos de vez em quando (dependendo da época de vez em sempre mesmo). E realmente eu estudei algumas coisas que eu não achei legais no começo e que depois de continuar estudando eu achei menos legal ainda, na verdade que eu odiei mesmo e vi como é diferente estar na faculdade e estar na escola. Primeiro que o professor pode fazer da sua vida um inferno só por filha da putagem e você não tem pra quem reclamar, segundo que ele pode fazer a matéria ser a melhor ou a pior, terceiro que eles fazem você acordar de manhã e tomar banho frio e FALTAM. A maioria das coisas eu posso dizer que gostei até de ter estudado, algumas foram sim um martírio quase tão horrível quanto física, química (parte inútil) e história de sergipe - mas pelo menos eu sentia a utilidade da coisa. E com relação a saídas, eu acabo nem saindo tanto e abandonando quase por completo diversos hábitos boêmios e a vida social se resume em ir na casa dos amigos jogar ou sair pra lanchar e até muito bom assim.

Tive várias aulas práticas, mas bem menos do que eu imaginava que teria e nem aquela coisa toda do Laboratório de Dexter, é legal a primeira vez, a segunda, a terceira, na quarta ficar em casa dormindo é melhor, dependendo do professor. No começo eu achava super legal olhar lâminas histológicas no microscópio, até eu ver que eu não via (!) quase nada ali por causa do meu daltonismo e cinco graus de miopia e era um tormento ficar 2, 3, às vezes 4h olhando pra uma coisa que na minha concepção filosófica silvio-santonista não existia (afinal, só acredito vendo). 

As aulas práticas de anatomia com cadáveres eram bem macabras e u gostava no começo, mas depois eu comecei a não curtir tanto porque era muita gente pra ver uma coisa e tudo era dito muito rápido - só era legal quando eu já tinha estudado e sabia o que estava sendo apontado antes de falarem (o que surpreendentemente aconteceu na maioria das vezes). Houveram algumas discussões éticas entre nós mesmos sobre o cadáver que estava lá servindo pra gente e tal, mas pouco tempo depois a gente já começou a tratar por "peça" - parece meio frio mas é o que acontece em todo lugar, eu acho. O mais chato era o cheiro insuportável de formol, que às vezes tava muito forte, às vezes suportável. Mas logo eu me acostumei também, parei de usar máscara e minhas lentes de contato protegiam meus olhos. Acostumar não é gostar. 

Aconteceram algumas práticas diferentes, como Eletrocardiograma da qual eu fui uma (não tão) feliz cobaia - porque eu sou muito tímido pra semi nudez na frente da sala inteira mas quem não? Aprendi a "tirar" pressão como dizem as pessoas menos informadas, o que é bem sem mistério. E recentemente aprendi a fazer coloração de gram em bactérias, pra saber se são positivas ou negativas (o que ajuda a direcionar o tratamento do infectado). É legal porque é quando você vê que o que é prendido na teoria serve pra prática de verdade, e cada aula que passa parece que tudo vai ficando mais focado no que vai ser a profissão de verdade e tudo o mais. Também por duas vezes tivemos que mexer com animais pequenos (camundongos) ou não tão pequenos (ratos mesmo) - uma vez pra atestar a eficácia de alguns fármacos e na outra, além disso, fizemos uma dissecação completa e cheguei a conclusão que ratos são mini seres humanos porque é tudo muito igual mesmo (nas estruturas internas e por vezes no comportamento, risos).

E também vi duas autópsias, uma completa e outra só no final. Achei bem tenso, não gostei tanto pra falar a verdade  na hora não tive medo, nem inibição, nem nojo (só do cheiro), nem nada, tenho que aproveitar tudo que aparecer cientificamente o máximo possível. Até cheguei mais perto, toquei todos os órgãos, procurei anormalidades fisiológicas (junto com os outros e com orientação do professor claro, não sou esse ninja todo... ainda!), e ajudei na dissecação do cérebro. Mas é meio tenso, não me imagino no lugar daquela pessoa. 

Nas férias tive o big plus de assistir umas cirurgias nos Hospitais Cirurgia (público) e Primavera (privado high class) de Aju; comprovei que os cirurgiões de um e de outro são os mesmos, assim como os anestesistas e enfermeiros, então não acho que a atenção terciária do SUS esteja deixando a desejar na questão recursos humanos quando se tem acesso a ela - o difícil é a demora pra ser atendido em um contra o atendimento quase imediato no outro. Outra coisa é a estrutura física. O SUS funciona com o mínimo possível, não tem conforto nenhum pros pacientes e profissionais, e tudo o mais, enquanto a saúde privada é uma coisa bem à lá Princeton Plainsboro (aquele hospital do House), com canhões de luz que parecem naves espaciais de Star Wars e equipamentos que poupam bastante trabalho dos médicos (anestesista por exemplo) e salas de repouso com várias comidinhas e TVs gigantes e macas pra dormir. E consegui ver algumas coisas que eu só tinha visto em cadáver em estado de putrefação avançada (essa a situação das pessoas do anatômico) em pessoas vivas, o que é muito mais interessante. Cirurgia é demais!

Não sei mais o que escrever porque foi tanta coisa ao longo de um ano que eu poderia passar outro ano só falando do que aconteceu. Foi o ano que eu mais estudei, mais fiquei nervoso e menos dormi na vida. Não sei se eu continuo sendo a mesma pessoa do ano passado, acho que sim, só um pouco mais acostumado com como é a vida de verdade (de "adulto") e acredito que agora o resto dos meus 27 anos será desse jeito mesmo, nada de voltar pra casa nem de parar de estudar ou dormir tanto quanto antes (o que eu vou sentir muita falta e compenso nas férias). Ah, e passei a assistir mais filmes do que antes, apesar que assim acabo assistindo alguns que eu não gosto tanto, mas o saldo geral é positivo.

Tchau!